Ela esperou horas. Meses. Anos. Um espaço de tempo que
pareceu uma eternidade. Isso por que, num dia qualquer, ao longo da semana, aquele
cara disse: “Eu te ligo sexta-feira, prá gente fazer alguma coisa!”.
Ela acende
o visor do celular incansáveis vezes, só pra confirmar se o sinal continuava cheio. Sim, continuava perfeitamente cheio.
Enquanto o visor do celular a encara, desafiador e vazio, ela
se desespera com ideias, pensamentos, confusões. Ela devia, realmente, espera
ele ligar? Ligaria para ele? Será que esse cara é do tipo escroto, que vai
pensar qualquer besteira só por que ela ligou? Ou é do tipo tímido, que vai se
decepcionar se ela não ligar? Ela corrompe as unhas, esbarra em seus próprios
pés enquanto roda em volta da cama. Será que ele quis dizer sexta que vem, e ela
nem precisava estar se desesperando hoje? Ou será que ele nem lembra que marcou
de sair com ela? Maldita frase! “Te ligo”... Tão imprecisa quanto mal dita!
Outra ideia angustiante é a de “fazer alguma coisa”. “Alguma
coisa” não é plano que se faça! Como alguém deve se vestir para fazer “alguma
coisa”? “Alguma coisa” é em lugar aberto ou fechado? Leva-se um casaco, uma
sapatilha para o caso de cansar-se do salto? Precisa-se ir com a unha feita,
escova intacta ou depilação feita para “alguma coisa”?
Ela chega a se assustar no momento em que a luz do celular
se apaga novamente. Era como se, apenas por uma fração de segundo, aquela breve
mudança de luz significasse que algo iria acontecer no celular. Quem sabe uma
mensagem, uma ligação, ou mesmo um sinal de que o telefone estaria
funcionando... Mas não. Ela atira o celular em cima da cama. Era melhor parar
de pensar naquilo. Trancou a porta do quarto, trotou até a cozinha e encheu um
copo d’água.
Enquanto ela bebia, pensava naquele cara. E se perguntava se
ele valia, realmente, todo aquele nervoso. Eles tinham ficado... uma vez.
Trocavam mensagens de texto frequentemente, mas... ainda não dava pra saber se
era sério. Essa seria a primeira vez que sairiam de verdade. Não... Não era
motivo pra tudo isso. Percebeu que continuava andando aflita de um lado para
outro. Olhou para o relógio. Para de ser
besta! Gritou consigo mesma por alguns segundos, e, depois de uma bronca
bem dada, sentou-se no computador, numa tentativa de se distrair.
Distrair. Distraiu-se... se traiu. Não resistiu. Checou o
e-mail, o Facebook, o Twitter, o Msn... até no Orkut ela entrou, só para ter
certeza. Ela procurava onde já sabia que não acharia. Não havia ninguém online.
Ele não estava online, e se por acaso estivesse online antes, tampouco havia tentado
procura-la,.
Desisto. E ela não
quis mais esperar. Eu não preciso passar
por isso. Não sou obrigada. Foi até o quarto, destrancou-o, pegou o
celular. Olhou para o número na tela por horas. E, finalmente, discou, sem
querer realmente que ele atendesse. Não saberia o que dizer. E decidiu milhares
de vezes qual seria a melhor frase pra se começar uma conversa casual, enquanto
aquela ligação se completava. E teve um infarto e morreu afogada ao mesmo
tempo, em meio ao silêncio esmagador do outro lado da linha. Dava tempo de se
arrepender? Até que...
“Sua chamada está sendo encaminhada para a Caixa de
Mensagens...”
Ela não quis deixar recado. Encerrou a chamada e se perdeu
novamente nas milhares de confusões que surgiam a cada segundo. Ele pode ter
esquecido o celular em casa. Ou ter ficado sem bateria. Ele pode ter desligado
o celular, para não ser incomodado. Pode ser que esteja sem sinal. Mas ele pode
também ter desligado de propósito, pra não precisar falar com ela. Para não ser
incomodado. Por ela?
Ela não queria se desesperar mais. Ela não quer se
precipitar em conclusões falsas, nem sofrer por antecipação. Ela sabia que havia
apenas uma resposta. Sabia também que ele poderia mentir sobre essa resposta, e
não haveria mais nada a fazer naquele momento. Não adiantava ficar se
perguntando, sendo que só ele poderia responder. Ela SABIA. Toda mulher conhece
lógica, e racionalidade. Mas é muito difícil discernir o que se sabe do que se
sente.
Naquele momento, ela
podia reagir de muitas formas. Ela podia gritar, jogar coisas na parede. Ela
podia continuar tentando ligar inúmeras vezes, deixar mensagem de voz e de
texto, e mandar e-mail. Podia sair, beber, curtir com as amigas e se controlar
pra não ligar pra ele bêbada no meio da noite. Podia simplesmente sentar no
sofá, assistir televisão, ouvir música, e fingir que nada daquilo tinha
acontecido. Fingir que aquilo não a atingia.
Mas não. Ela se trancou dentro do quarto e sentou-se na cama.
Encarou o celular novamente, como se, uma última vez, o desafiasse a tocar. Naquele
ponto, já não adiantava mais esperar. Ainda que o cara ligasse... Já àquela
hora da noite, ela teria certeza de que ele estaria ligando apenas uma noite de
sexo. E que, toda aquela ansiedade não teria valido a pena, ao menos não vale a
pena por apenas uma noite.
Em silêncio, atônita, arrancada a língua de seu corpo, junto
com suas reações, deitou sua cabeça no travesseiro. Deixou, no entanto, seu
celular, deitado também ali, no travesseiro ao seu lado. Talvez sentindo que
aquele aparelho, mesmo mudo, pudesse substituir a presença daquela ligação
ausente. E se viu ali. Trancada num
quarto. Deitada na cama. Numa sexta-feira à noite. Aguardando a possibilidade
de que talvez, possivelmente, quem sabe, um cara qualquer poderia ligar. Era
patético demais.
Então ela chorou. E chorou. E percebeu o quanto havia se
envolvido com alguém... que não existia! No fundo, ela sabia que ligação que
ela aguardava não era do cara que conversou com ela, um dia desses, naquela
semana. Era de um cara que ela criou na cabeça dela. Ela esperava um encontro
com uma ilusão. Mas não pense, por um segundo, que ela chorava pelo cara. Ela
chorava por que sua mente brigava com seu coração. A mente culpava o coração,
por ser tão tolo, e criar tantas expectativas sobre coisas impalpáveis. Já o
coração, culpava a mente por estar causando aquela dor dilacerante, a dor de
estar com vergonha de si mesma. Uma dor que ninguém tiraria dela por muito
tempo, pois lhe seria lembrada a cada vez que olhasse no espelho.
Enquanto chorava lágrimas sutis e vagarosas, contemplando um
instinto autofágico de engolir-se, se afogar nas próprias entranhas, entrar nas
próprias profundezas e nunca mais deixar ninguém encontrar aquela menina frágil
e machucável, ela adormeceu. Adormeceu em lágrimas. Mas não sem antes decidir
que nunca, jamais, ela permitiria que alguém a fizesse sentir daquele jeito
novamente. Aquela seria a última vez que alguém a faria sentir inferior.
Primeira e última vez.
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