quarta-feira, 3 de abril de 2013

Dor

Estava perdida na noite. A madrugada cinza e pegajosa se encostava sobre seus ombros, e a lua caçoava levemente do espaço desengonçado que a cercava. Não havia mais nada no vazio da escuridão além da solidão que a perseguia.

Estava perdida na manhã. Andava curvada, sem entender a correria que a afugentava. Havia vozes, sons e todas as buzinas, que não percebiam a sua presença. Entorpeceu-se de presas e desatinou a fugir da multidão solitária, sem bem olhar de quem se esquivava.

Estava perdida na vida. Suspirava pelos palcos espaçados por semáforos, mas a plateia sobre pneus corria rápido demais. Não armava-se em nada, não mais se sustentava. Estava cercada de cegos que não sabiam ver. E se ela gritasse a plenos pulmões, tampouco eles ouviriam, por serem também surdos que não querem ver.

Estava perdendo a vida. Vivia a amargar suas derrotas. Fugia de tudo, até de si mesma. Suas vozes se confundiam com os sons e buzinas, seu corpo a suplicava atenção, gritava socorro. Ela não ouvia. Ela não queria olhar para o grito que a assustava mais. E se esmagava nas multidões, esperando que o caos pudesse dar a atenção que suas próprias vozes tanto precisavam.

Estava a vida. E lutava por si. E quem sabe o acaso a pudesse ajudar? Não haveria mais de sofrer, e poderia curar a si mesma. Por que quando a mente não quer ajudar ao corpo, é que a mente também precisa de ajuda. E quando a mente e o corpo não se entendem, sofre também a alma. E o caos nas cidades e a zombaria da lua, na alma, fazem todo o sentido. E é tudo intenso demais para entregar nas mãos do acaso.

Estava na noite. Estava na manhã. Estava na vida. Estava em cada passo que dava. Estava no corpo. Estava na alma. Estava em qualquer lugar. Perto demais para evitar. Cínico e desagradável. Incisivo e sutil. Estava lá. E ela não tinha mais escolha a não ser lidar.

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